PALAVRAS VALEM A PENA
...
Há alguns anos atrás trabalhei na região dos jardins num momento em que as coisas não andavam nada bem. Não sei por que cargas d’gua decidi subir diariamente a pé e de mochila nas costas a Rua Casa Blanca ,aquela que começa na Av. Paulista, foi nesse diário trajeto que dei ciência da minha loucura, pois, admirado descobri a sinuosa beleza das arvores, a imperiosa majestade com que se prendem no solo ao modo de garras de velho condor,enfileiradas fazendo sombra, ou melhor, tirando o brilho ao luxo dos prédios , era como falar com deus; nesse matutino trajeto fiquei convencido que diariamente elas(as arvores) me esperavam com os braços abertos a me mostrar cada fenda, seus olhos o seu córtex cortado e a lacrimosa de seus caules.A coisa foi ficando pior pois passei a pesquisar às arvores, as suas categorias, origem, morfologia e classes até o formato de suas folhas sua geografia,pois sequer eu sabia com quem estava falando, se eram pinhos ou carvalhos,Nogueiras ,seringueiras,cajueiros,mamoeiros,jequitibás, mangueiras,seringueiras ou o abacateiro do Gil, em fim, arvores mil.
Terceiros olhos aparte, esta minha urbana experiência desceu diretamente na aula que apresentou a nos William Wordswoth e seus Narcisos (mais de mil) me culpei um pouco por haver relacionado num primeiro momento o titulo do poema ao personagem da mitologia grega e seu significado.
Desde os primeiros semestres desta nossa acadêmica caminhada, às vezes nem tão acadêmica, verificamos de forma cartesiana que os acontecimentos sócias são os grandes produtores das diversas narrativas e a mudança de suas características estéticas ao longo da história, e no nosso caso da historia de ocidente. A gente tem falado da singular percepção do poeta e sua extraordinária espiritualidade depois compartilhada com nos. Como épocas tão difíceis e tumultuadas podem provocar reações tão sublimes como este poema? Wordsworth, grosseiramente traduzido para o português quer dizer: Palavras valem ou a palavra vale a pena.
Ainda dentro deste contexto Vale a pena citar a Tagore:
"A terra, insultada, vinga-se dando-se flores".
'SOLITÁRIO QUAL NUVEM VAGUEI'
Solitário qual nuvem vaguei
Pairando sobre vales e prados,
De repente a multidão avistei
Miríade de narcisos dourados;
Junto ao lago, e árvores em movimento,
Tremulando e dançando sob o vento.
Contínua qual estrelas brilhando
Na Via Láctea em eterno cintilar,
A fila infinita ia se alongando
Pelas margens da baía a rondar:
Dez mil eu vislumbrei num só olhar
Balançando as cabeças a dançar.
As ondas também dançavam neste instante
Mas nelas via-se maior a alegria;
Um poeta só podia estar exultante
Frente a tão jubilosa companhia:
Olhei – e olhei – mas pouco sabia
Da riqueza que tal cena me trazia.
pois quando me deito num torpor,
Estado de vaga suspensão,
Eles refulgem em meu olho interior
Que é para a solitude uma bênção;
Então meu coração começa a se alegrar,
E com os narcisos põe-se a bailar
William Wordsworth
in 'O olho Imóvel Pela Força da Harmonia'
Tradução de Alberto Marsicano.
ernesto caceres